Renan Dos Santos Jesus 3. Internação em Casos de Transtornos - TopicsExpress



          

Renan Dos Santos Jesus 3. Internação em Casos de Transtornos Mentais Os transtornos mentais fazem emergir situações dolorosas em que pais procuram tratamento para seus filhos em instituições públicas ou privadas e batem às portas do judiciário relatando suas perdas: vivem sem paz, sem saúde, perderam todo ou parte do patrimônio familiar, não conseguem mais dormir. Normalmente o fazem em razão de comportamento agressivo e/ou suicida de seus filhos que, doentes, chegam ao fundo do poço e não encontram forças para submergir. Há, também, outras enfermidades mentais graves que causam grande sofrimento à pessoa, não lhe permitindo ter uma vida saudável, sendo muitas vezes necessária sua internação. Às vezes a situação é inversa. São os pais que causam problemas aos filhos. Ou outras pessoas de um núcleo familiar mais amplo. Mas, o fato é que, na busca pela proteção e direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, a Lei n. 10.216 de 6 de abril de 2001, trouxe normas importantes que devem ser trabalhadas com cuidado, sobretudo em face das profundas controvérsias que suscita. O primeiro aspecto que cumpre enfatizar está disposto no artigo 4º. Segundo ele, “A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”. Este artigo traduz a opção legislativa no sentido de limitar as internações psiquiátricas, inspirado em um movimento da Psiquiatria que defende que a interação do doente na sociedade é considerada parte do processo de tratamento e/ou cura. Por isso, a sua segregação do meio social, profissional e familiar, somente em situações extremas, seria recomendável do ponto de vista médico e legítima do ponto de vista jurídico. Por outro lado, não podemos nos esquecer de que essas situações extremas acontecem e que não são tão raras assim. É clara AUTONOMIA PRIVADA E INTERNAÇÃO NÃO CONSENTIDA 89 a tentativa da lei em banir de vez, da nossa sociedade tratamentos excludentes e segregadores. Mas não há verdades absolutas. Mesmo a teoria cientifica mais avançada ou atual não é a última palavra. O intérprete da norma jurídica (profissionais do Direito, profissionais da Medicina e mesmo o cidadão comum) pode se deparar com situações de necessidade premente de internação não consentida do paciente. A opção por esse tipo de Psiquiatria acabou por influenciar a estruturação do sistema de saúde mental passando de um extremo ao outro. Naturalmente que banida a internação com características asilares que demandava um número muito grande de leitos, hoje, o que se vê é a redução considerável de vagas em hospitais psiquiátricos, o que é, para muitos, compensado pela existência dos Centros de Atenção Psicossocial. A Lei n. 10.216 prevê três tipos de internação: a voluntária, que se dá com o consentimento do paciente; a involuntária, feita a pedido de terceiros, sem o consentimento do paciente; e a compulsória, realizada através de ordem judicial (parágrafo único do art. 6º). Em todas as situações a internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado com a caracterização dos motivos (art. 6º, caput). A internação voluntária certamente é a menos problemática para discutirmos. É claro que a situação concreta vai mostrar a facilidade ou a dificuldade da família no convencimento do paciente. Há aqueles que têm clara consciência acerca da necessidade do tratamento e concordam com a internação, ainda que reincidentes. Outra questão diz respeito à internação não consentida prevista em duas modalidades do art. 6º: a internação involuntária e a internação compulsória. Nesses casos há flagrante embate de vontades. O paciente não deseja a internação e a família não vê outra solução senão ela. Aqui, poderíamos vislumbrar as seguintes situações: i) existindo 90 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS POLÍTICOS discernimento do paciente, e este não querendo ser internado, em princípio, não há como a família fazê-lo; ii) Mas, supondo a existência de discernimento e, ainda que o paciente não queira ser internado, a família poderia fazê-lo se o portador de transtorno colocasse em risco a vida de terceiros; iii) E, no caso de não existir discernimento do paciente e suas ações colocarem em perigo a própria vida e/ou a vida de terceiros, é possível a internação. Essas hipóteses se relacionam à modalidade de internação involuntária. Há também, outras possibilidades de tensão em relação à internação compulsória: iv) o próprio paciente ou mesmo a família consideram desnecessária a internação determinada pelo Estado por decisão judicial; v) a família considera necessária a internação do paciente que vem a ser negada em decisão judicial. A razão para pensarmos nesses desdobramentos e para os assumirmos como legítimos está centrada na exigência normativa genuína da Modernidade de que a todos sejam reconhecidas iguais liberdades. Ou, em outras palavras, o paciente deve ser respeitado na construção da sua pessoalidade, resguardado seu direito de liberdade e autonomia na tomada de decisões numa relação médico-paciente; a família, que não raras vezes suporta o ônus de cuidado para com o parente próximo, e não obtém do Estado atuações concretas para atender as legítimas expectativas dos titulares do direito à saúde; a sociedade que também precisa ser protegida de atos anti-sociais, agressivos e, por vezes, criminosos, que atentem contra seus direitos fundamentais. Em qualquer caso de internação, voluntária ou não consentida, as pessoas portadoras de transtornos mentais têm direitos que devem ser respeitados (art. 2° da Lei 10.216/2001): I ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperaAUTONOMIA PRIVADA E INTERNAÇÃO NÃO CONSENTIDA 91 ção pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V ter direito a presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII receber maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. Vale ressaltar que mesmo em dispositivo normativo que trate de doenças mentais, o consentimento livre e esclarecido do paciente é relevante, na tomada de decisões. Não vemos como ser de outra forma pelo leque de situações que podem comportar distintas graduações de discernimento. Então, sendo o paciente detentor de discernimento em razão do qual manifesta sua vontade de não sujeitar-se a internação hospitalar e não trazendo risco à vida de terceiros, ainda que exponha a sua própria a risco, do ponto de vista técnico-jurídico, não é legítima a decisão familiar pela sua internação. De outro lado, inexistindo discernimento, e a falta dele leva-o a colocar-se em situação de risco, mesmo não provocando perigo a terceiro, é legítima a decisão familiar de internação. Para o Direito, capacidade implica ter direitos (capacidade de gozo) e exercê-los por si só. A capacidade de gozo não é negada 92 REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS POLÍTICOS a nenhum ser humano; a de exercício é reconhecida aos seres humanos que têm discernimento para tomar decisões e suportar as conseqüências dessas. As doenças mentais podem determinar uma redução da capacidade de exercício (incapacidade relativa) ou em situações extremas, a negação dela (incapacidade absoluta). Acontece que, mesmo os indivíduos que tenham capacidade jurídica para decidir podem, em razão da doença, não ter condições de elaborar uma vontade livre e consciente. Imaginemos a situação em que uma pessoa que tenha vida produtiva, trabalhando, estudando, firmando compromissos e honrando-os, apresente quadro de anorexia nervosa. Essa pessoa, em princípio, está apta a exercer todos os atos da vida civil e, mesmo assim, não possuir condições mentais para tomar decisões acertadas a respeito do tratamento. Essa pessoa, a despeito de desejar a cura, rejeita o tratamento em razão da crença de que este a deixaria ainda “mais gorda”. Em um quadro como esse, pessoas com peso abaixo do normal, recusam receber alimentação, colocando em risco a própria vida. O erro de julgamento é evidente, o que nos leva a concluir pela falta de competência para decidir no caso concreto. Para o Direito, a substituição da vontade da pessoa pela vontade da família se dá pelo processo de interdição com a nomeação de curador/tutor. Todavia, se para as demais questões da vida, a pessoa tem discernimento, essa interdição afigura-se uma injustificada violação da autonomia privada. Nessa esfera, então, o conceito de capacidade e incapacidade do mundo do Direito não resolverá o problema, razão pela qual, é possível lançar mão do conceito de competência utilizado pelos profissionais da área de saúde6. 6 “A capacidade é o critério legal que indica ser o indivíduo capaz de tomar decisão autônoma e válida, já a competência refere-se ao conceito clínico de possuir habilidades para a tomada de decisões válidas em relação ao tratamento. Apesar de não ser habitualmente feita clara distinção entre esses conceitos, isso seria de grande valia. A capacidade seria o conceito fixo, usualmente ligado a aspectos legais, seria ´a habilidade de entender e assimilar informações relevantes para decisão em questão
Posted on: Wed, 24 Jul 2013 08:55:35 +0000

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