"Era você, aliás, sempre foi. Ou melhor dizendo, nunca deixou de ser. Era você quando eu comprava chocolate branco só porque eu lembrava que você gostava mais que o preto. Era você quando eu ouvia músicas dos anos 70 ao invés das atuais, porque você sempre dizia que nenhuma “bandinha de merda” iria conseguir superar os Beatles, e talvez você tenha realmente razão. "All you need is love" você tatuou no ante-braço, talvez seja por amor aos Beatles, mas a minha teoria é que você sinta falta de amar e ser amado, porque eu sei que no fundo dessa estrutura ogra e grossa, você sente falta do meu calor humano perto do seu corpo nos dias frios. E eu sei que no fundo, no fundo, ainda que você não queira, você sente minha falta, nem que seja ao menos um pouquinho e depois passe. Essa é a minha única certeza em meio à todas as incertezas que nós sempre fomos: você vai sentir minha falta, assim como hoje e todos os dias eu sinto a sua. Mas deixa eu te contar uma coisa estúpida: era e ainda é você. Era você de manhã, de tarde, de noite, mas era você principalmente de madrugada, às três horas da manhã quando não passa nada de bom na televisão, e as lembranças são as minhas únicas companheiras. Era você, em todos os lugares, em todas as coisas e em todas as pessoas. Era você o atendente com pinta de cafajeste no supermercado, era você o garoto que estava de mãos dadas com o sobrinho caçula na fila do cinema, era você na padaria, na fila do banco, na entrada do shopping, no estacionamento do meu prédio e em todos os outros lugares. Eu projetava a sua imagem como eu nunca havia projetado a imagem de outra pessoa antes. Eu virei um projetor de cinema velho com apenas uma fita rodando em meio a ferrugem, pra ser mais exata, a única imagem que o meu projetor de cinema velho e sujo conseguia reproduzir, era a sua. Eu fui corpo, alma, coração e artérias com você. Você me viu nua, de corpo, de alma e de sentimentos. Você foi o único que conheceu as partes podres e obscuras do meu coração. Você foi o que talvez nenhum outro homem consiga ser. Você, você, você e mais você. Porque por mais que eu não queira, todos os meus textos improvisados contém traços seus. Todas as minhas frases curtas feitas no calor da hora, tem vestígios seus. Todos os meus textos gigantescos são pra você, sempre foram. Eu queria te dizer que foi você, que é você, e que talvez continue sendo você. E eu definitivamente não sei aonde eu estava com a cabeça quando eu dizia que não era. Porque eu sei, você sabe, e todos os outros também sabem: eu nunca te superei por inteiro, porque as coisas nunca ficaram esclarecidas entre nós. Apesar dos pesares e de todos os meses de lutas internas, e de pessoas novas e de outras conversas mais interessantes que as suas, eu ainda não consegui te largar por inteiro do meu corpo, sua marca ainda está cravada no meu pescoço. Seu cheiro ainda está impregnado nos meus lençóis, o seu cinto ainda está guardado no meu guarda-roupas e o cheiro das suas meias podres, ainda continua no canto do quarto. Você foi embora, e por mais que você tenha ido embora há meses, seu cheiro ainda continua nos meus lençóis sujos e talvez nunca saia de lá." (Apesar dos apesares)
Posted on: Thu, 29 Aug 2013 12:56:56 +0000
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