ESPECIAL – PROTESTOS NO BRASIL. Ótima contribuição de RICARDO - TopicsExpress



          

ESPECIAL – PROTESTOS NO BRASIL. Ótima contribuição de RICARDO ALVAREZ, editor de Controvérsia, para o blog da REA. Destaco: “O Lulismo deu a tônica na gestão federal na última década no Brasil nos governos Lula e Dilma. Internamente baseia-se num programa de governo de ações econômicas tímidas e com resultados sociais significativos. Elevou setores da base da pirâmide social, a partir de políticas compensatórias, para um patamar pouco acima, o que lhe rendeu amplo apoio popular, especialmente nas camadas mais pauperizadas. Provocou mudanças sem mudar. Reduziu os níveis de pobreza e miséria sem afetar os grandes interesses e nem tampouco amedrontar os donos do capital. O PIB cresceu e as duas extremidades da pirâmide foram as mais beneficiadas. Os avanços obtidos circunscreveram-se nos marcos da manutenção da estrutura de desigualdade e segregação social reinantes de séculos no Brasil. Eis a chave de seu sucesso até então. Antecedido por uma década de neoliberalismo em estado puro, sob o comando de Collor e FHC, que apertaram o garrote aos movimentos sociais, ampliaram a submissão aos agentes internacionais (FMI, Banco Mundial, OMC) e levaram às ultimas consequências os preceitos do Estado mínimo e da desregulamentação. Foram apoiados, diga-se de passagem, pelas elites e pela grande mídia. Herdando este cenário e sem disposição de romper de fato com ele, o Lulismo implantou na agenda conservadora algumas políticas públicas que, de fato, produziram alguma mobilidade no padrão de renda das classes mais baixas, abrindo a elas inclusive a perspectiva de uma maior inserção no consumo, via expansão do crédito, mas não deu respostas sobre as questões estruturais de desigualdades abissais persistente na sociedade brasileira. Foi uma mudança de rumos sem rupturas. Creio que o estado de convulsão social observado nas últimas semanas resulte da combinação apontada acima: de um lado o esgotamento das políticas neoliberais típicas no Brasil (década de 90) e no mundo; de outro, o esgotamento de sua faceta nacional, o Lulismo (década de 2000). A questão central que se colocava então era como navegar entre a negação do desastre social neoliberal e permitir uma melhora na qualidade de vida da base da pirâmide sem rupturas sociais. Quais horizontes poderiam se abrir quando se oferta mais ao capital e se promete também mais ao trabalhador? Aglutinar antigos desafetos e históricos inimigos fez crescer sua base de apoio na sociedade, no parlamento e nos poderes constituídos. Mas teve uma contrapartida pesada na perda de identidade do partido e no consequente rebaixamento do programa. Desta combinação decorrem duas outras consequências diretas: a abdicação da mobilização social como elemento de sustentação do poder e a permanente ocorrência de crises pela acirrada disputa de nacos orçamentários e de posições privilegiadas nos órgãos do governo. O caminho encontrado apontava para a modernização conservadora: permitir a ampliação do consumo através da oferta de crédito e, ao mesmo tempo, manter intocadas as reformas estruturais típicas de um programa democrático popular, uma vez que estas explodiriam a sustentação do governo nesta ampla coalização costurada com setores conservadores. Um dos elementos chaves para que esta agenda política contraditória, mas hegemonicamente voltada aos interesses dos grandes grupos pudesse seguir adiante, foi a transformação paulatina do PT num partido de lideranças e caciques. Os canais que oxigenavam a antiga relação líder e base crítica foram sofrendo asfixia lenta e gradual, porém deliberada. Neste processo, o PT foi deixado de lado e o gabinete da presidência da República foi alçado à condição de comitê central decisório. A reforma agrária patinou, o MST manteve proximidade com o governo, mas o agronegócio também, indicando ministros. Abriram-se vagas em novas universidades públicas federais, mas o grande capital no ensino privado superior se esbalda com recursos públicos do PROUNI. O salário mínimo aumentou e as bolsas assistenciais também, tirando da miséria absoluta uma parte da sociedade brasileira. Mas, ao mesmo tempo, cresceram os ganhos do capital financeiro e de outros setores, aos quais estão profundamente imbricados: o agronegócio e mercado imobiliário. Como consequência, o Brasil continua a apresentar uma das maiores desigualdades de renda no mundo. Com 84% da população morando em cidades, as contradições ganham maior visibilidade. Pequenas ilhas de riqueza ladeadas por um mar de assentamentos precários, transporte público insuficiente e caro, serviços públicos de educação e saúde cada vez mais deteriorados, ausência de espaços públicos de sociabilidade, trabalho precarizado e superexplorado, coação e violência por parte da polícia, dentre outros. E eis que agora começam a erigir nas grandes cidades novos templos, as modernas arenas de futebol, anunciando a todos, enfim, que há dinheiro! As massas que foram para as ruas neste junho de 2013 disseram um não coletivo ao conjunto dos problemas e demonstram clara insatisfação com as limitadas políticas redistributivas, reivindicam serviços públicos de qualidade e mais baratos. Até esta mobilização nacional o inimigo mais poderoso e articulado do Lulismo foi a grande imprensa, ironicamente alimentada pelo Estado. É indesejável, mas compreensível a despolitização de parcela dos manifestantes. Reflexo direto deste quadro é a pauta de reivindicações extensa e diversificada. Exprime mais o descontentamento geral contra este estado de coisas, do que uma mobilização organizada e focada em temas específicos. O problema é que as forças políticas organizadas, que poderiam dar maior consistência aos pleitos, estão à deriva desta mobilização. Deve-se, contudo, saudar a irrupção desta mobilização e estimular sua manutenção. Deve-se mais: disputar as bandeiras de luta nas ruas, debatendo com esta parcela de descontentes uma pauta que alavanque mudanças no sentido da expansão da oferta e qualidade dos serviços públicos e da radicalização da democracia. Parece que as vitórias obtidas, como a redução das tarifas de transportes, a rejeição da PEC 37, o congelamento provisório dos preços públicos, dentre outros, tiveram o caráter pedagógico de mostrar que as mudanças que queremos virão de baixo para cima e não o contrário. Este é o contexto da Reforma Política e por isso é incabível pensar em Referendo, mas sim em Plebiscito. As forças conservadoras desidratam as lutas sociais com bandeiras estéreis, como o combate à corrupção e a defesa do Brasil e da democracia, e alçam Joaquim Barbosa (o Presidente do Supremo Tribunal Federal) à condição de líder, descarregam sua munição na PEC 37, etc. Mas outro patamar de lutas é possível e deve ser a grande aposta da juventude que entendeu que as redes sociais servem à mobilização, mas não a substitui. E é exatamente aqui que se situa a ineficiência do Lulismo: atender as grandes demandas sociais por serviços públicos e de qualidade e não substituir este direito pela condição de consumidor de bens domésticos (importante, mas insuficiente). Mas este caminho exige o enfrentamento e a ruptura com o Brasil da Casagrande e Senzala. A política do agrado aos dois lados permite se chegar exatamente aonde se chegou: ampliar consumo sem romper com a estrutura de desigualdades sociais historicamente constituídas e arraigadas na sociedade brasileira. O que está em jogo é a construção de uma nação como nunca antes se viu: profundamente democrática, menos desigual, participativa e dotada de serviços públicos básicos de qualidade e universais.”
Posted on: Wed, 03 Jul 2013 04:41:40 +0000

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